09/04/2014

Fala, Serius!

Serius é um deus esquecido. Não adianta procurar na mitologia porque lá ele não está. Segundo o célebre estudioso Neutralis, que conhece os bastidores romanos, gregos, africanos e outros menos cotados, de fio a pavio, Serius foi banido por Júpiter para sempre. O que ele fez para desagradar Júpiter ninguém sabe e ninguém jamais saberá. Como para sempre não existe, consta que neste exato momento Serius encontra-se reencarnado como um cidadão comum, desprovido de qualquer poder, no meio de nosso querido e amado Brasil.
Apesar de ter perdido seus poderes majestosos, Serius mantém-se como um ser retilíneo, circunspecto, pensador e, por consequência, pouco dado à galhofa e às farofagens que marcam nossa vida cotidiana. Ele tem um defeito: em princípio acredita no que os outros falam. Como dizem os mais descolados, Serius não tem jogo de cintura. Mas, não é um ingênuo. Serius tem como princípio dar crédito às teses alheias e, depois, no recolhimento noturno, enquanto se delicia com uma providencial taça de vinho tinto, com o vagar que convém, se entrega à racionalização das coisas.
A vida nos últimos dias tem sido dura até mesmo para Serius. Na semana passada quando passeava pelo centro da cidade, influenciado pela “pesquisa” de um órgão do Governo de que seis e meio em cada dez dos homens são potenciais estupradores, Serius não entendia como nem porquê. Tinha uma leve desconfiança de que aquela história estava muito mal contada. Chegou em casa e se pôs a escarafunchar na internet. Visitou blogs e sites de feministas e achou tudo muito sério. Num deles a moça, muito culta por sinal, que talvez não tenha nascido de manipulação genética, abria guerra contra todos os homens do mundo. Dizia que queria acabar com esta raça infeliz, imunda, que só traz desgraça à humanidade, que usurpa das mulheres e patatipatatá. Em princípio Serius acreditou.
Outra moça narrou que foi estuprada no Haiti. Porém, agradece ao estuprador que a fez abrir os olhos para realidade cruel: ela, num lance de magia enquanto sofria ardentemente por ter seu corpo violado, viu uma luz em sua frente que identificou no estuprador a sociedade patriarcal e imunda que oprime as mulheres.
Moças bem-intencionadas expunham fotos sem roupa, com expressões carrancudas portando cartazes dizendo que não mereciam ser estupradas.
À noite, ele se recolheu como de costume. E o vinho desceu pela sua garganta, mansamente como sempre. E Serius começou a meditar. Porém, no meio do exercício foi despertado pelo som que saía da tevê onde um apresentador com cara indignada dizia que o “estudo científico” do Governo havia sido divulgado com graves distorções. Serius não entendeu mais nada. Como assim, engano? Como assim, muda tudo? Como assim, o caso é grave mas não é tanto? Como assim? Como assim? Como assim?
Serius neste momento está passando por alguma dificuldade. Na noite passada passou pela sua cabeça buscar algum apoio. Talvez um psiquiatra, um psicólogo ou um terapeuta. Parafraseando Caetano, o Brasil fundiu a cuca de Serius.
O que Serius não sabe (e é bom que nem venha a saber) é que nos encontramos no país da pegadinha. A mais nova (e sempre tem algo novo e surpreendente por aqui), um professor resolveu chamar uma moça destas do funk, Valeska Popozuda, de grande filósofa em uma prova. Isto causou perplexidade em um aluno que postou parte da prova nas redes sociais. Serius ainda não viu esta matéria. Se encontrá-la pensará, pelo menos num primeiro momento, que a grande contribuição do nosso país para a filosofia é mesmo a Valeska.

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